Matéria publicada originalmente no Jornal da Unicamp
Uma tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp pode ajudar jornalistas, comunicadores, cientistas e gestores de comunicação de instituições de ensino superior público a compreender melhor o papel da comunicação pública de ciência e tecnologia (CPCT) no contexto de suas atribuições, sejam elas voltadas a informar, engajar ou tornar o conteúdo produzido apropriável pela sociedade, sempre no sentido de ampliar a democratização do conhecimento científico. Contudo, como é possível saber se as ações de CPCT empreendidas pelas universidades públicas estão de fato permitindo alcançar os objetivos almejados?
Cibele Maria Garcia de Aguiar Pereira trabalha desde 2011 na área de comunicação da Universidade Federal de Lavras (Ufla), em Minas Gerais, e conhece bem os gargalos enfrentados pelos profissionais do mesmo setor em outras instituições de ensino superior público, que trabalham nas várias frentes conectando academia e sociedade. “Na prática é muito difícil saber se estamos fazendo a coisa certa, porque temos uma grande demanda diária e lidamos com uma equipe pequena para atender tanto a comunicação institucional como a comunicação de ciência e tecnologia [C&T]”, diz a jornalista, que trabalha há 25 anos com comunicação pública. Pereira lembra que não é fácil medir a relação mantida entre o mundo acadêmico e a sociedade, como tampouco é fácil determinar se a entrega de conteúdo está sendo feita de forma efetiva. Além disso, também é difícil saber se o conteúdo está tendo um bom engajamento ou se está conduzindo a uma maior participação da sociedade em assuntos afeitos a C&T.
Sob a orientação do docente Sérgio Luiz Monteiro Salles Filho, a pesquisadora buscou na literatura modelos que pudessem embasar o monitoramento da CPCT e que fossem aplicados no contexto brasileiro das universidades federais. É aí que a tese inova. “Quanto mais eu estudava, mais eu via que não existia um modelo pronto para tal análise”, diz a agora doutora. Pereira propôs, então, em seu estudo, um modelo capaz de apontar etapas e variáveis relevantes e que possibilita identificar se, como e por quais caminhos a CPCT atinge diferentes objetivos. O modelo, que utiliza indicadores de resultado e impacto, é totalmente reproduzível e adaptável. E mais: foi corroborado por meio de uma pesquisa feita junto a gestores de comunicação de universidades federais brasileiras.
“Qual a minha condição atual e aonde pretendo chegar?”, essa é a pergunta mais importante no processo de monitoramento e avaliação do alcance do trabalho dessas equipes no âmbito da CPCT. A pesquisadora destaca que o planejamento das mudanças necessárias para alcançar os objetivos desejados deve ser feito de acordo com a realidade da instituição. “Cada contexto institucional deve ser levado em conta na escolha da régua a ser usada para o acompanhamento e avaliação do desempenho pretendido”, aponta Pereira em sua tese. Para isso, é necessário identificar o potencial de ação de CPCT da instituição, o que inclui a estrutura, a equipe e a política de comunicação para, em seguida, avaliar se os ob- jetivos da universidade foram atingidos.
O modelo proposto por Pereira apresenta três tipos ideais de objetivos da CPCT: o informativo, o de engajamento social e o participativo. Para avaliá-los, a pesquisadora utilizou 26 indicadores aplicados em um questionário online que registrou a percepção dos gestores de comunicação de 51 universidades federais, de um total de 69, sendo apenas duas instituições identificadas no tipo participativo. O estudo permitiu discernir o perfil de atuação da área de comunicação das universidades de acordo com a ênfase na estrutura, na política, no planejamento e na gestão de indicadores relacionados ao monitoramento e avaliação da CPCT. A pesquisa também aponta uma importante realidade das instituições: o reduzido número de profissionais na equipe de comunicação, a limitação de recursos financeiros, a indisponibilidade de profissionais para avaliações qualitativas, a limitação de ferramentas de rastreamento do engajamento e a falta de articulação entre diferentes setores da instituição são os principais fatores que dificultam ou im- pedem os resultados e impactos espera- dos para a CPCT.
O modelo serve de parâmetro para que as equipes de comunicação pensem no contexto em que atuam e para facilitar o diálogo entre a área de comunicação e a gestão superior na identificação dos objetivos a serem alcançados e dos meios e equipe disponíveis para o que está sendo proposto. “Ao aplicar o modelo, uma universidade pode usar esses indicadores para monitorar certo período de tempo e planejar aonde quer chegar. O modelo ajuda a instituição, portanto, a avaliar se ela está avançando na direção que planejou ou não”, diz Salles Filho. “Não gostamos de ser avaliados, mas, no contexto da tese, a avaliação não é para punir ou exigir uma mudança de um setor que já é tão exigido no seu dia a dia. A ideia é pensar em suas próprias barreiras e se o que está sendo feito leva, realmente, ao objetivo almejado”, explica Pereira.
Ainda de acordo com a pesquisa, as mídias digitais e sociais são os meios de comunicação mais empregados entre as instituições respondentes. Todas as universidades têm contas no YouTube e no Instagram. Facebook, Twitter, LinkedIn e WhatsApp também são utilizados pela grande maioria dessas instituições. Além dessas mídias, o rádio é o meio mais utilizado pelas respondentes, seguido por TV, podcasts, revista e jornal impresso. Das 51 universidades, 41 possuem um único site para notícias institucionais e de C&T. Para a pesquisadora, apesar do acesso às redes sociais e mídias digitais ser um caminho sem volta, é necessário entregar a informação de formas diferentes para atingir públicos diferentes, contribuindo assim com a democratização do conhecimento.
Por Eliane da Fonseca Daré
Fotos: Felipe Bezerra/divulgação
Edição de imagem: Alex Calixto/paulo Cavalheri