Publicado originalmente no Jornal da Unicamp
Estudo do LER, em parceria com a Petrobras, traz avanços significativos na caracterização mineralógica do pré-sal
Um grupo de pesquisadores do Laboratório de Espectroscopia de Reflectância (LER) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, liderado pelo docente Carlos Roberto de Souza Filho, realizou um estudo sobre rochas do pré-sal a partir de um sistema de escaneamento hiperespectral. O estudo foi conduzido no Centro de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes) da Petrobras, localizado no campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) na Ilha do Fundão, um dos principais complexos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) voltados à indústria do petróleo no mundo.
De acordo com Souza Filho, “os sensores do scanner hiperespectral, que operam nos intervalos de comprimento de onda da luz visível e infravermelho de ondas curtas do espectro eletromagnético, permitem a captura da luz refletida pela superfície dos materiais rochosos a partir de uma varredura”. Gera-se, assim, uma imagem de alta resolução que registra a assinatura espectral de cada pixel. “A partir do processamento e da interpretação da imagem hiperespectral, são obtidas informações químico-mineralógicas sobre o material analisado. Isso só é possível graças ao fato de cada componente da rocha reagir diferentemente à interação com a luz, o que dá origem às assinaturas espectrais distintas”, explica o pesquisador.
Os equipamentos de imageamento hiperespectral do IG foram adquiridos por meio do financiamento de um projeto de infraestrutura do LER e da Petrobras, elaborado em 2018, sendo usados desde então em projetos de P&D do instituto em parceria com empresas petrolíferas e com instituições acadêmicas. A utilização desses sensores em pesquisas do grupo tornou o laboratório um dos principais do mundo em termos de aquisição de dados hiperespectrais aplicados às geociências. “O imageamento hiperespectral fornece um método rápido e não destrutivo para mapear a mineralogia de rochas que são cortadas durante a perfuração dos poços, os testemunhos”, explica Delano Menecucci Ibanez, colaborador do projeto e integrante da Gerência de Tecnologias de Sedimentologia e Petrologia do Cenpes.
De acordo com Ibanez, as informações obtidas pelo scanner da Unicamp podem ser usadas, entre outras aplicações, na avaliação da qualidade dos reservatórios de petróleo, incluindo seu mapeamento mineral, sedimentológico e de presença e tipo de óleo. “A capacidade de destacar a variação mineralógica das rochas do reservatório permite inferências sobre a porosidade e permeabilidade do sistema petrolífero. Isso tem implicações para exploração e produção de hidrocarbonetos, incluindo redução de custos e de impactos ambientais”, explica o geólogo. Ao serem vinculadas aos mapas hiperespectrais, as amostragens auxiliam na construção de modelos geológicos dos reservatórios que refletem com maior precisão heterogeneidades composicionais e mecânicas, implicando uma melhor produção de petróleo.
O imageamento hiperespectral é amplamente utilizado na indústria de mineração, mas relativamente novo na indústria de petróleo e gás. A exploração e a produção de petróleo no pré-sal são um dos grandes desafios científicos e tecnológicos da Petrobras, que não conta com esse tipo de equipamento em seu parque analítico. “Acredito que o imageamento hiperespectral conduzido pelo grupo da Unicamp provocará uma revolução na identificação, na quantificação mineralógica e no mapeamento das amostras das rochas do pré-sal”, destaca Ibanez.
A utilização do scanner hiperespectral do IG permitiu aos pesquisadores do Cenpes acompanhar pela primeira vez em suas instalações a operação em tempo real desse tipo de sistema. “Isso possibilitou a comparação dos resultados obtidos por meio desse método com aqueles adquiridos valendo-se de técnicas mais tradicionais de caracterização mineralógica das rochas compreendidas nos testemunhos arquétipos [modelos que representam características essenciais associadas a determinada formação geológica] do pré-sal. Tal caracterização mineralógica por imageamento hiperespectral é muito expedita, não requer a preparação das amostras e pode resultar em mapeamentos importantes para o entendimento dos reservatórios de petróleo”, explica Souza Filho. Os dados hiperespectrais obtidos no estudo estão em fase de processamento e possibilitarão a elaboração de mapas que serão apresentados e discutidos com diferentes equipes da Petrobras.
Além de Souza Filho, que coordena projetos de pesquisa no Cenpes, participaram da equipe da Unicamp que realizou o estudo: Bernardo Freitas, docente do IG, Rebecca Scaffuto e Raphael Hunger, pós-doutorandos do projeto, Lucas Miranda, pesquisador do LER, e Samara Medeiros, doutoranda do Programa de Formação de Recursos Humanos da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Medeiros retornará ao Cenpes em junho, onde permanecerá por seis meses para um estudo colaborativo que dará continuidade ao projeto.
Ainda em junho, em parceria com a Nexa Resources, esse mesmo grupo participará de uma pesquisa de campo em Paracatu (MG), onde deverá investigar potenciais análogos ao pré-sal no Brasil. Para isso, além das análises de testemunhos a partir do scanner, o grupo de pesquisadores deverá obter dados hiperespectrais em afloramentos – exposições de rochas – a partir de drones.
Texto Eliane Fonseca Daré
Fotos: arquivo pessoal