A tese "Mudança de paradigma no enfrentamento da crise ecológica: uma abordagem integrada entre o Direito e as Ciências da Terra” é uma das vencedoras da 1a. edição do Prêmio de Reconhecimento Acadêmico em Direitos Humanos Unicamp-Instituto Vladimir Herzog. Defendida por Giorgia Sena Martins junto ao Programa de Ensino e História das Ciências da Terra (PEHCT) do Instituto de Geociências (IG) em outubro de 2020, sob orientação de Luciana Cordeiro de Souza Fernandes, da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), a tese criou um enfoque totalmente inovador para o enfrentamento da crise ecológica, unindo o Direito às Ciências da Terra.
Por meio de uma abordagem transdisciplinar, Giorgia entrelaçou a importância do Direito e das Ciências da Terra para promoção dos Direitos Humanos e da dignidade da pessoa humana, sob o enfoque do princípio da vedação ao retrocesso ambiental. A linguagem utilizada foi mais clara e menos rebuscada, comum no mundo jurídico, para facilitar seu entendimento. Também foram utilizados recursos, como inspeções judiciais, mapas mentais, vídeos e documentários que vão além da letra fria da lei ou da análise racional de argumentos jurídicos.
De acordo com Giorgia, o Brasil vive uma crise ecológica sem precedentes. A proteção ambiental sofreu graves retrocessos com agravamento em 2020. A tese analisou tais retrocessos e suas consequências, que atingem a saúde, a ecologia e a economia, comprometendo a dignidade humana e a qualidade de vida. “Constatei que os conflitos ambientais decorrem da tensão existente entre o público e o privado, ou seja, das tentativas de apropriação de bens comuns a toda a coletividade por algumas poucas pessoas, para uso próprio ou para a obtenção de lucro”, aponta. De acordo com a orientadora Luciana Fernandes, “o texto abarca uma construção dialógica entre áreas tidas como distintas, e até distantes, quando da formulação da legislação e ou do exercício político no Brasil, e, para tanto, a autora se utilizou de uma percepção complexa e sistêmica, de interdependência entre ecologia, economia e saúde”.
O trabalho demonstra o aumento progressivo das oportunidades de apropriação de bens comuns no âmbito da legislação ambiental brasileira. “Além disso, demonstrei a chamada ‘irresponsabilidade organizada’ em um caso concreto, que trata de um empreendimento de luxo que destruiu 93 hectares de APP (áreas de preservação permanente, cursos d´água, restingas e nascentes) sem que o Estado tenha enfrentando isso eficazmente”, conta Giorgia. “A partir da constatação da origem histórica, jurídica e filosófica do problema e de sua exemplificação legislativa (histórico-normativa, ou seja, os terríveis retrocessos ambientais) e prática (o tal empreendimento de luxo), propus caminhos concretos para a mudança”, complementa.
Prêmio
A 1º edição do Prêmio de Reconhecimento Acadêmico em Direitos Humanos Unicamp-Instituto Vladimir Herzog nasceu da necessidade de destacar pesquisas científicas que reconheçam e atuem em favor da dignidade humana. Foram contempladas pesquisas de mestrado/doutorado realizadas por estudantes das Universidades Estaduais Paulistas (Unicamp, USP e Unesp) de graduação e de pós-graduação stricto sensu encerradas em 2020 nas seguintes categorias: Ciências exatas e tecnologia; Ciências naturais, da saúde e meio ambiente; Ciências sociais e educação; Ciências da comunicação e linguagem.
Para Giorgia, “é uma alegria imensa poder honrar o Programa de EHCT com esse prêmio tão importante. É relevante difundir o papel das Geociências na defesa da vida. Espero que o prêmio atraia a atenção de outros pesquisadores para as enormes potencialidades do Ensino de Ciências da Terra para a construção de um mundo verdadeiramente melhor, com sentimento de pertença, propósito e engajamento. Também vejo que a premiação contribuirá para divulgar a ideia que o mundo atual demanda uma visão complexa, integrada, não-fragmentária; a ideia de que precisamos, mais do que nunca, sair de nossos mundinhos fechados e dialogar abertamente e sem preconceitos com outros campos do saber. Dedico especial carinho, gratidão e deferência ao Professor Celso Dal Ré Carneiro, grande Mestre, que me apoiou incondicionalmente nessa arriscada aventura de aliar o Direito às Ciências da Terra e compartilhou generosamente sua imensa experiência acadêmica na área e à Professora Luciana Cordeiro por ter aberto as portas do Instituto de Geociências da Unicamp para o Direito Ambiental”.
De acordo com Luciana Fernandes “como professora de Direito Ambiental em uma Universidade que não contempla este curso, dadas os retrocessos legislativos e o descaso administrativo - notadamente do executivo federal - com a questão ambiental no país, é uma grande vitória, um orgulho imenso. Vejo como uma grande oportunidade de dar voz à vida e ao meio ambiente, permitindo que este trabalho assente um 'tijolinho' na construção da cidadania ambiental, tão cara nos dias atuais, para que possamos alcançar os direitos humanos de forma plena no Estado brasileiro”.
A cerimônia virtual de entrega ocorre nessa quinta-feira, 04 de março, às 17h, com transmissão pelo canal da TV Unicamp no YouTube.
Por Eliane Fonseca Daré
Fotos - arquivo pessoal