Pesquisa etnográfica foi realizada em duas agências de inovação ligadas a universidades públicas
Entre suas funções dentro de universidades e institutos de pesquisa, cabe aos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) gerir atividades de proteção à propriedade intelectual e impulsionar a inovação e a transferência tecnológica. Em sua tese de doutorado em Política Científica e Tecnológica no Instituto de Geociências, Ana Carolina Spatti analisou duas agências de inovação de universidades públicas brasileiras, usando a etnografia para identificar e caracterizar fatores que afetam seu desempenho.
Os resultados encontrados por Ana Carolina foram apresentados na tese De perto e de dentro: uma caracterização dos fatores que afetam o desempenho de Núcleos de Inovação Tecnológica, escrita sob a orientação da docente Milena Serafim, da FCA. “Pela primeira vez são identificados, descritos e analisados, com esses materiais e métodos, fatores internos dos NITs relacionados ao seu desempenho organizacional. São, sobretudo, aspectos intangíveis, como conhecimentos, competências, relações de poder, processos de negociação e aspectos burocráticos”, aponta Ana Carolina.
Das duas agências de inovação que foram foco do estudo, uma delas está ligada a uma universidade pública federal e outra a uma estadual, ambas com forte interação com a indústria e importantes processos de proteção de ativos de propriedade intelectual e transferência tecnológica. Um fator importante na escolha das agências deveu-se à aceitação da pesquisa por parte da equipe dos NITs. Ana Carolina teve contato direto com pessoas de todas as áreas durante sete meses. Valendo-se de técnicas de observação participante e entrevistas não diretivas, ela cumpria, verdadeiramente, um horário de trabalho: ia todos os dias da semana in loco, chegando às 8h e saindo ao final do expediente. Assim, conseguiu explorar elementos culturais, sociais e institucionais dessas agências, envolvendo liderança, motivação, comunicação, política e estrutura organizacional. O contato contínuo possibilitou a observação de comportamento, ações e interações sociais, além de favorecer a análise das representações sobre a prática de trabalho e dos desafios cotidianos de uma agência de inovação.
Para a orientadora Milena Serafim, a principal contribuição do estudo está na forma inédita de abordar os NITs "de perto e de dentro", buscando compreender como os fatores organizacionais conformam as características e o potencial de atuação desses Núcleos. “O estudo coloca em xeque o padrão mimético de práticas que dão certo em outros contextos, destacando o papel de influência dos fatores institucionais, humanos (comportamentais) e de recursos (incluindo os informacionais) na tônica de sucesso ou não desses NITs. Os estudos de implementação de políticas públicas mostram como o ambiente organizacional imprime uma lógica que não pode ser preterida; pelo contrário, ela é a alavanca ou o entrave do processo”, diz.
Dentre outros achados, a pesquisa preenche lacunas relacionadas à participação dos NITs na organização e na missão geral das universidades, assim como aquelas ligadas à gestão da propriedade intelectual e à transferência de tecnologias. O estudo indica que os gestores das universidades devem posicionar a agência de inovação com uma governança ampla na universidade, permitindo que atividades administrativas e operacionais sejam realizadas de forma autônoma e desburocratizada.
Os NITs têm dedicado grande parte de seus esforços à proteção de ativos de propriedade industrial, tais como patentes. Em sua tese, Ana Carolina aponta que o desempenho das agências não pode ser medido apenas pelos resultados comerciais associados à propriedade intelectual e à transferência de tecnologias. A eficiência também depende de fatores como número de funcionários qualificados, autonomia da organização, sistemas de motivação, clima organizacional, ferramentas e sistemas de gestão, habilidades de comunicação, negociação, treinamentos e networking de pessoal. São recursos, capacidades e competências da organização e do indivíduo em sua relação de trabalho. Pela abordagem metodológica, o estudo também contribui para subsidiar experiências etnográficas em organizações e para orientar práticas de pesquisa de campo.
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Por Eliane Fonseca
Fotos: Pixabay, acervo pessoal e Antoninho Perri
Edição de imagem: Renan Garcia